sábado, 18 de fevereiro de 2017

Reflexóes sobre a Igreja e a Política

18.02.2017
Postado por Pr. Robenildo Lins

Comentaremos sobre as relações dos cristãos, igrejas e pastores com a política,
levantando a seguinte questão:

 "Deve uma igreja cristã envolver-se em campanha política?".

Esta pergunta é pertinente em nossos dias, pois corriqueiramente em épocas de eleições se vê igrejas transformando seus púlpitos em palanques eleitorais e trocando as músicas feitas para Deus por jingles de campanha.

É de Bertold Brecht (1898-1956) o seguinte pensamento: "O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, não participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio depende das decisões políticas. O analfabeto político é tão sem entendimento que se orgulha e estufa o peito, dizendo que odeia a política. Não sabe que de sua ignorância nasce à prostituta, a criança abandonada, o assaltante e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, o corrupto e o explorador das empresas nacionais e multinacionais".

O cristão como cidadão de uma sociedade democrática e pluralista deve desenvolver uma correta consciência política, interferir nos destinos da nação por meio do voto e participar da vida pública candidatando-se a cargos públicos. O cristão não deve ser um alienado político. Mas, e a Igreja cristã como instituição divinamente estabelicida por Deus deve envolver-se na política e em suas campanhas eleitorais?

Creio que, devido ao princípio da separação entre a Igreja e o Estado, a Igreja não deve tomar partido deste ou daquele candidato, ou deste ou daquele partido político. Isso significa que não é eticamente correto transformar o púlpito da igreja num “palanque” eleitoral, nem tampouco a Igreja assumir qualquer responsabilidade política, secretaria ou ministério seja do governo municipal, estadual ou federal.

Quando uma igreja apóia abertamente um candidato ou um partido político ou uma coligação está se colocando politicamente contra uma parcela da sociedade que não apóia tal candidato ou tal partido político. Ou seja, quando uma igreja se torna politicamente amiga de um grupo, automaticamente se torna inimiga de outro. Isto é totalmente contraditório à natureza da Igreja e à sua missão na terra que é atrair todos os homens para Cristo, através da fé em Jesus.

O partidarismo político na Igreja é um grande obstáculo e um enorme empecilho para a evangelização dos homens. Aliás, a evangelização, o anúncio das Boas Novas, é um dos grandes propósitos de Cristo para sua Igreja. O partidarismo político faz a igreja ir à contramão desse grande propósito. Com certeza isso é algo que não agrada o coração de Deus.

E o cristão? É lícito ao cristão candidatar-se a um cargo político? Acredito que, embora a Igreja deva ser “apolítica”, seus membros têm o direito como cidadãos de um país democrático de se candidatarem e se elegerem para cargos políticos, fato este que deve ser encorajado a fim de que haja a transformação da nossa sociedade em uma sociedade mais justa e piedosa.

Nada há na Palavra de Deus que proíba o cristão de filiar-se a um partido político e candidatar-se a um cargo público. Pelo contrário, a Bíblia relata a história de grandes homens de Deus que assumiram funções políticas: José, primeiro-ministro do Egito; Davi, rei de Israel; Josias e Ezequiel reis de Judá; Daniel, um dos ministros de Estado do reino da Pérsia; Mordecai, primeiro-ministro na Pérsia; Neemias, governador de Judá após a volta do cativeiro; etc.

Devido à corrupção que impera na política brasileira, a sociedade clama por homens e mulheres que levem a sério os cargos públicos para os quais foram eleitos pela população. Isto mostra que o meio político precisa cada vez mais de políticos cristãos comprometidos com Deus e com a sociedade.

Todavia, diante desta grande e urgente necessidade, particularmerte vejo uma problemática que a igreja tem diante de si e que precisa ser resolvida. O grande desafio para a Igreja é encontrar alternativas e meios de eleger candidatos cristãos comprometidos com Deus e com a sociedade, sem transformar o púlpito da Igreja em “palanque” político, e sem usar a Igreja como instrumento de manobra das massas.

Precisamos também fazer algumas indagações: a grande maioria dos políticos que se dizem cristãos têm realmente exercido influência positiva na política, ajudando efetivamente a transformar para melhor a sociedade brasileira? A medida que elegemos mais e mais cristãos tem diminuído os índices de criminalidade e corrupção no Brasil afora? Os políticos "cristãos" têm sido verdadeiramente “sal da terra e luz do mundo” conforme Jesus ordenou? Não têm sido alguns políticos “cristãos” encontrados envolvidos com a corrupção? Quantos políticos nominalmente cristãos que se elegeram levantando a bandeira do evangelho estão envolvidos nos escandalosos "mensalões" da vida pública, não somente em Brasília, mas em todo o País? Uma vergonha! Precisamos pensar, refletir, sobre esta triste realidade...

E na hora de votar? Qual deve ser a postura do cristão? Como se deve escolher em quem votar? Creio que devemos sempre nos fundamentar nestes princípios do voto ético:

1. O voto é intransferível e inegociável. Com ele o cristão expressa sua consciência como cidadão. Por isso, o voto precisa refletir a compreensão que o cristão tem de seu País, Estado e Município.

2. O voto é uma questão de consciência pessoal. Portanto, o cristão não deve violar a sua consciência política. Ele não deve negar sua maneira de ver a realidade social, mesmo que um líder da igreja tente conduzir o voto da comunidade numa outra direção.

3. Os pastores e líderes têm a obrigação de orientar aos fiéis sobre como votar com ética e com discernimento. No entanto, devem evitar transformar o processo de elucidação política num projeto de manipulação e indução político-partidário. A diversidade social, econômica e ideológica que caracteriza a igreja evangélica no Brasil deve levar os pastores a não conduzir processos político-partidários dentro da igreja, sob pena de que, em assim fazendo, eles dividam a comunidade em diversos partidos.

4. O pastor não deve permitir que candidatos, partidos ou coligações usem a ele próprio e a igreja como “cabos eleitorais” de campanha política. A igreja não deve ser usada como palanque político para manobra das massas.

5. É fundamental que o candidato evangélico queira se eleger para propósitos maiores do que apenas defender os interesses imediatos de um grupo ou de uma denominação evangélica. É óbvio que a igreja tem interesses que passam pela dimensão política. Todavia, é mesquinho e pequeno demais pretender eleger alguém apenas para defender interesses restritos às causas temporais da igreja. Um político evangélico tem que ser, sobretudo, um cristão na política, e não apenas um “despachante” ou “office-boy” de igrejas.

6. Não basta o candidato ser crente, irmão na fé, honesto e ter boas intenções. É preciso avaliar se tal pessoa possui qualificações e vocação política para o cargo, mesmo que não tenha experiência política. O que deve ser observado no candidato:

a) Se o candidato é uma pessoa lúcida, que já está envolvida em causas sociais, e comprometida com as causas de justiça e da verdade.

b) Se possui uma ideologia social e político-partidária clara e definida. A grande maioria dos candidatos nem sabe o que é isso. Estão em determinado partido não pela sua ideologia político-social, mas pelas chances que tal partido lhe dá de ganhar as eleições.

c) Se é um bom administrador, tanto de sua vida pessoal quanto de seus negócios.

d) Se possui um plano de governo e propostas claras e tangíveis.

7. Não basta o candidato ser carismático, falar bonito ou sair bem na foto. É necessário analisar se tal candidato possui qualificações e vocação política para o cargo, se é honesto e trabalhador. É importante também saber qual é a posição do candidato sobre questões morais e religiosas.

8. Se alguém está pensando em votar em um candidato que já exerceu ou está exercendo um cargo político, deve procurar saber quais foram as suas realizações e projetos durante o seu mandato. Não adianta, por exemplo, um vereador apresentar vários projetos se nenhum deles traz benefícios práticos à população (nome de rua, honra ao mérito, data comemorativa, etc.).

9. Os fins não justificam os meios. Portanto, o eleitor cristão não deve jamais aceitar a desculpa de que votou em um determinado candidato apenas porque obteve a promessa de que, em fazendo assim, ele conseguirá alguns benefícios para a igreja, sejam rádios, concessões de TV, imóveis, linhas de crédito bancário ou outros “trocos”, ainda que menores. É verdade que nos bastidores da política haja acordos e composições de interesse, entretanto, admitir que tais “acertos” impliquem a prostituição da consciência de um cristão, mesmo que a “recompensa” seja, aparentemente, muito boa para a expansão da causa evangélica. Afinal, Jesus não aceitou ganhar os “reinos deste mundo” por quaisquer meios. Ele preferiu o caminho da cruz.

10. Os eleitores evangélicos devem votar nos candidatos de sua escolha, sobretudo, baseados em programas de governo, e não apenas em função de “boatos” do tipo: “O candidato tal ateu”; ou: “O fulano vai fechar as igrejas”; ou: “O sicrano não vai dar nada para os evangélicos”; ou ainda: “O beltrano é bom porque dará muito para os evangélicos”. É bom saber que a Constituição do Brasil não dá a quem quer que seja o poder de limitar a liberdade religiosa de qualquer grupo. Além disso, é valido observar que aqueles que espalham boatos, quase sempre, têm a intenção de induzir os votos dos eleitores assustados e impressionados, na direção de um candidato com o qual estejam comprometidos.

11. Nenhum eleitor evangélico deve se sentir culpado por ter opinião política diferente da de seu pastor ou líder espiritual. O pastor deve ser obedecido em tudo aquilo que ele ensina sobre a Palavra de Deus, de acordo com ela. No entanto, no âmbito político, a opinião do pastor deve ser ouvida apenas como a palavra de um cidadão, e não como profecia divina.

Por fim, quero concluir falando sobre a compra de votos. O que significa a “compra de votos”? A compra de votos é o ato do candidato que propõe ao eleitor que este lhe dê o seu voto, em troca de algum bem ou vantagem que lhe é entregue ou oferecido.

A criatividade para conseguir o voto do eleitor não tem limites quanto aos bens e vantagens pessoais oferecidos, especialmente diante de tantas carências populares. Segundo uma pesquisa, a lista é longa e vai desde alimentos básicos diversos tais como açúcar, óleo, sal, tíquetes de leite, bebidas, dentaduras, óculos, sapatos, roupas, ajuda para obter documentos, pagamento de fiança de presos, cimento, areia, pedra, tijolos e outros materiais de construção, além de ferramentas, insumos agrícolas, uniformes para clubes esportivos, bolas e redes, enxovais, cobertores, berços, etc. Uma lista sem fim que expõe todas as dificuldades vividas pelo povo brasileiro.

O artigo 299 do Código Eleitoral brasileiro (Lei no.4737, de 15 de julho de 1965) estabelece que a compra de votos de eleitores é um crime com a pena prevista de até 4 anos de reclusão, além de multa. Além da prisão, o candidato deixará de ser candidato tendo seu registro cassado pelo Juiz Eleitoral.

Termino citando as palavras de Jesus à Poncio Pilatos, momentos antes de sua crucificação: "Nenhuma autoridade terias... se de cima não te fosse dada" (Jo 19:11). 
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